Chamo-me Catarina Freire. Tenho 19 anos. E estive a viver um mês no Camboja. Foi uma viagem fantástica. Tenho recordações tão diversas como ficar atolada no meio do nada ou passar horas a observar a beleza natural. Mas o motivo que me levou lá, foi fazer voluntariado. Candidatei-me online, através de uma organização neozelandesa, International Volunteer HQ, para o programa Orphanage Care. Fui rapidamente aceite. Marquei os voos com muita antecedência, consulta do viajante, tinha tudo pronto e ainda faltavam meses.
Estava entusiasmada. Mas só quando chegou a hora de entrar no avião sozinha é que me apercebi do que estava a fazer. Mil e uma dúvidas cruzaram-me a cabeça: Onde vou viver? Será que é mesmo isto que quero fazer? Quando cheguei, fui colocada na organização Hands of Hope Community, um centro de dia para 16 crianças com diferentes tipos de deficiência. O primeiro dia foi um choque... mas hoje posso dizer que foi a melhor coisa que me podia ter acontecido.
Dia e noite em Phnom Pehn
O meu dia começava às 6 e 30. Arranjava-me e, quando descia, já tinha o meu condutor de tuk tuk à espera, sempre com um caloroso "good morning". Fazia uma agradável viagem, no meio do trânsito infernal com buzinadelas a cada 10 segundos. Chegava ao trabalho às 7 e 45 e já as crianças esperavam que abrisse as portas e montasse os materiais. Depois de tudo instalado e limpo e de uns exercícios de aquecimentos, preenchia-se a folha de presenças, rezava-se e cantava-se. As crianças com capacidades de aprendizagem, tinham aulas, as outras faziam desenhos educativos e outras brincavam.
Havia uma pausa para o segundo pequeno almoço e, depois, as atividades eram retomadas. Às 11 e 30 almoçavam as crianças. A minha tarefa era alimentar uma das raparigas que não se conseguia mexer. Iam fazer a sesta (coisa muito comum também entre os crescidos) e, a seguir, era a vez de os adultos almoçarem. De tarde, não havia aulas e todas as crianças desempenhavam tarefas domésticas para adquirirem autonomia. Mais tarde, brincavam e jogavam, especialmente futebol.
Às 16 horas, o meu dia de trabalho acabava e ia para casa. Eu e mais 20 voluntários de vários países Austrália, França, Hong Kong, China, EUA e Canadá, entre outros vivíamos com uma família local, que ganha a vida com o alojamento de voluntários. Era sempre a primeira a chegar a casa e aproveitava esse tempo para falar com a minha família. Por volta das 18 horas, já todos tinham chegado e jantávamos. Nós jantávamos numa mesa, a família comia no chão, como é tradicional no Camboja.
Os voluntários saíam quase todas as noites, porque havia sempre alguém que acabava o seu programa e voltava para casa e efetuávamos uma festa de despedida. As noites, em Phnom Pehn, eram fantásticas, muito parecidas com as da Tailândia, também com um lado menos bom - o do turismo sexual. Começávamos sempre a noite num bar mais europeu e acabávamos numa discoteca de locais. Andávamos sempre com os nossos condutores de tuk tuk por uma questão de segurança.
Surpresa em Angkor Wat
Durante os fins de semana, íamos viajar. Como éramos muitos, costumávamos alugar uma carrinha. Mas, uma vez, decidimos fazer uma viagem noturna de oito horas num autocarro local, que acabou por demorar doze. Foi uma das experiências mais loucas que vivi. O autocarro ia cheio, com pessoas sentadas no meio do corredor, galinhas no porta-bagagens, bancos partidos, janelas fechadas o que se revelou caótico quando alguém começou a vomitar. O "melhor" de tudo foi quando o velho veículo se avariou no meio do nada, às 2 da manhã e ninguém falava inglês para nos explicar o que se passava. Acabámos por apanhar boleia e, então, fomos nós deitados nos corredores. Tudo valeu a pena, porque, chegados a Siem Reap, passámos dois dias a visitar os templos de Angkor Wat. Magnífico.
Ter os fins de semana livres era fantástico, pois permitia abstrair-me de alguns momentos que vivia durante a semana. Um dos piores dias, para mim, foi quando angariei algum dinheiro para as crianças irem à praia. Elas ficaram tão felizes, nunca tinha visto crianças tão contentes na minha vida com uma coisa tão simples. Foi realmente doloroso assistir a tanta felicidade, em troca de tão pouco. Todo o dinheiro que a Hands of Hope Community angaria é através de voluntários, como eu, que passam por lá e quando regressam aos países de origem recolhem dinheiro junto das famílias e amigos.
Foi uma experiência tão marcante quanto inesquecível, que recomendo a qualquer um. Aprendi muito e decerto que vocês também irão aprender.
Daqui.