Teresa Olazabal, Uma vida entregue
Como surgiu o seu desejo de ir ao encontro dos sem-abrigo, na noite do Porto?
Um dia de inverno, há 20 anos, as temperaturas no Porto desceram até aos 2 graus negativos. Duas amigas e eu fomos à baixa com cobertores, ovos cozidos e chocolates, saber se era preciso ajuda. Quando vi um homem deitado no chão na rua, instintivamente ajoelhei-me junto dele e pela primeira vez percebi que era ao próprio Jesus que estava a atender. Nunca mais deixei de lá voltar.
A Teresa conseguiu reunir um grupo de amigos que lhe permitem levar por diante o trabalho com os sem-abrigo sem criar nenhuma “instituição”. É fácil, trabalhar assim, sem rede?
O AMOR não cabe em estatutos e normas. É gratuito, livre e espontâneo. Nunca seremos uma instituição, mas não é fácil trabalhar assim.
Um dos aspetos mais originais do seu trabalho com os sem-abrigo é cuidar tanto da dimensão espiritual quanto da material. Em cada encontro mensal com eles, há tempo para celebrar a fé, para o convívio, para a distribuição de bens materiais. De onde nasceu este modo diferente de estar com os sem-abrigo?
O nosso grupo está sempre em processo de criação, crescimento e discernimento. Foi muito claro para nós que a principal fome desta «população» é Jesus. Um dia, em oração, conversei com Jesus sobre a maneira de saciar esta fome. Jesus foi muito claro na sua resposta: «Leva-me contigo». Atordoada e sem saber como, perguntei-Lhe onde, porque não tinha sítio. Jesus voltou a falar-me muito claramente: «Vou contigo onde eles estão». E o grupo esteve de acordo.
São conhecidas as suas celebrações de Natal com os sem-abrigo, que incluem sempre a celebração da Eucaristia. E também começam a ser conhecidos os «Retiros» espirituais para sem-abrigo, que organiza anualmente. Fale-nos do que acontece nestas ocasiões...
A ideia da Missa de Natal apareceu como a continuação lógica da oração de rua. É o ponto alto dos nossos encontros, e a ternura de Deus que Se quer aproximar de cada um dos Amigos da Rua como há 2000 anos Se aproximou dos coxos, cegos, paralíticos e leprosos. É muito especial. Quanto aos «Retiros» espirituais, são uma graça que o Senhor, na sua imensa Misericórdia, nos quer dar – aos que os recebem e aos que os orientam; as vidas e as feridas dos corações brotam dolorosamente e Jesus consola, cura, toca. São momentos de uma imensa beleza.
A Teresa tem uma longa história de voluntariado. Onde começou a prestar este serviço? Recorda algum episódio ou pessoa que mais a tenha marcado?
Os três sítios onde o Senhor me chamou a servi -Lo, foram os deficientes profundos, os doentes terminais oncológicos, e os sem-abrigo. Há muitos episódios marcantes na minha vida de voluntária, sendo que o principal foi o de ter sido possí- vel receber em casa um sem-abrigo em estado terminal para o atender, tratar e amar durante três meses e acompanhá-lo até à sua morte. Um grande presente do Céu.
A sua família acompanha-a e apoia-a neste serviço?
É costume em casa não se falar dos deficientes e dos doentes terminais, apesar de um dos meus filhos me acompanhar há bastante tempo com os sem-abrigo.
Recentemente, viu-se inesperadamente atingida pela doença. Como integra uma realidade assim na sua vida de fé?
Várias doenças atingiram-me, e à minha família, nos últimos meses. Só em Deus e na Fé é possível com-viver com Paz e Alegria a realidade da doença, tendo como certo que Deus não manda o mal nem a doença, mas que Se interlaça nela para tirar o maior bem. Isto leva a que a doença passe a ser uma graça que agradeço ao Senhor todos os dias e todo o dia. Costumo fazê-lo recitando frases do Magnificat de Nossa Senhora.
Se quisesse resumir a sua vida cristã, que palavras escolheria?
Entrega.
Daqui.
Fotografias:
1 - O Gregório que morreu em nossa casa, uns dias antes de morrer
2 - O Rui (deficiente) comigo
3 - Diante deste homem na rua ajoelhei-me
4 - O senhor António em Soutelo
5 - Uma deficiente de que cuidei
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